Carne ou frango? A pergunta decorre da manifestação de Márcio Holland, secretário de Política do Ministério da Fazenda, em tentativa de distanciar o governo da disparada da inflação em setembro. Sim, porque o índice anualizado bateu em 6,75%, enquanto o centro da meta é 4,5%, com dois pontos percentuais de tolerância.
É interessante que uma autoridade do governo tente transferir para o consumidor a responsabilidade de combater a carestia, quando quem gasta muito mal os recursos financeiros públicos – uma montanha de dinheiro arrecadado via impostos, taxas e contribuições – sejam os gestores da economia.
Quem faz compras em supermercados e nas feiras livres já percebeu que os aumentos de preços se generalizaram. Isso preocupa porque enfrentamos duríssima batalha até domar a inflação com o Plano Real, em 1994. Antes dele, havíamos sofrido com constantes pacotes econômicos, que, em sua maioria, achatavam salários sem controlar as maquininhas de remarcação de preços.
Inflação é o imposto mais cruel que existe. Penaliza mais quem tem menor renda, sem condições de investir parte dos vencimentos em aplicações financeiras. Países como o Brasil – é só ver o que acontece na Argentina e na Venezuela – não podem facilitar nesta área. Qualquer cochilada pode ser fatal.
Antes de você sentir o baque no bolso, os valores dos produtos percorrem um caminho por demais conhecido. Toda vez que um bem – carne bovina, automóvel, calça jeans, enfim, qualquer um – tem mais demanda (gente que quer comprá-lo) do que oferta (produção), fica mais caro.
Para evitar isso, é necessário controlar os gastos públicos, criar um bom ambiente para investimentos produtivos e não fomentar a desconfiança empresarial com constantes mudanças nas regras do jogo econômico.
O consumidor pode ajudar a frear reajustes? Sim, quando forem sazonais (em determinada época) ou fora do normal (por especulação e domínio do mercado, dentre outras distorções).
Nesses casos, caberia, então, trocar a carne bovina por frangos, suínos ou peixes. Que ninguém se deixe enganar, no entanto. Se os fundamentos econômicos não estiverem sólidos, isso não adiantará.
Da mesma forma, não resolve adiar correções de preços de combustíveis, nem de tarifas como a energia elétrica. Hoje ou amanhã, a fatura chegará e diminuirá o poder aquisitivo da população.
Congelamentos de preços, como nossos vizinhos tentam fazer sem sucesso, só desequilibram a produção e o comércio. Convidam os empreendedores a não investir, desabastecendo as prateleiras e multiplicando a conta.
Antes de passar a bola para os cidadãos, portanto, o governo tem de fazer a sua parte. Reeditar os ‘fiscais do Sarney’ é repetir uma tolice.
Substituir produtos ajuda as pessoas a controlar gastos, é claro, mas quando todos os preços da economia estão em alta, o combate à inflação depende quase que exclusivamente do governo.
Não podemos nos esquecer de que o estímulo exagerado ao crédito para a compra de bens e serviços endividou as famílias. Na sequência, a oferta de empréstimos pelos bancos caiu, e a economia entrou em recessão.
Quem vencer o segundo turno das eleições terá, sem dúvida, um desafio muito grande: ajustar a economia, o que implicará duras medidas. É semelhante à situação de quem não vai ao médico nem faz exames preventivos. Quando a doença se manifesta, os tratamentos são mais difíceis e invasivos. As chances de cura também diminuem.
Desconfie de quem disser que o Brasil voltará a crescer com baixo custo de vida em um passe de mágica. Controle seus gastos, não faça dívidas nem comprometa sua renda além do necessário.
Seja seletivo e cauteloso na hora de comprar. Não sucumba a modismos nem às tentações do consumismo.
Cutucaram a inflação com vara curta. Teremos de domar, novamente, o dragão dos preços altos.