A pontuação que acaba com seu crédito

Por Maria Inês Dolci

Qual a sua pontuação nos bancos de dados de empresas de análise de crédito?  Você não sabe, eu não sei, nós não sabemos, porque a prática do scoring (pontuação) vem ocorrendo sem que haja transparência dos critérios utilizados.

Esses sistemas coletores de informações sobre os consumidores não divulgam o que consta sobre nós, mas, por causa desses dados, uma loja, concessionária de veículos ou banco talvez nos negue crédito, ou nos aumente os juros em uma operação financeira.

Isso contraria o direito à informação, claramente estabelecido no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Além disso, estas empresas deveriam sujeitar-se a um ‘mínimo existencial’, ou seja, a aqueles direitos essenciais à dignidade humana.

Um desses direitos é saber o que há contra você em questões judiciais ou em bancos de dados privados, para que possa corrigir eventuais informações incorretas e até ilegais.

Como não sabemos o que está arquivado sobre nós, é possível que os critérios utilizados nestes arquivos sejam subjetivos, e que, em função deles, uma empresa nos considere mais propensos a não pagar uma dívida. Já houve casos internacionais em que o modelo de carro, o tabagismo e o consumo de bebidas alcoólicas entraram nesta avaliação.

A discussão é atual e ‘quente’ porque o Superior Tribunal de Justiça (STJ) realizou uma audiência pública sobre score no último dia 25 de agosto, da qual participaram entidades de defesa dos direitos do consumidor, associações de lojistas, defensorias públicas e o Banco Central.

Essa audiência foi motivada por ações judiciais contra a pontuação, impetradas por consumidores no Rio Grande do Sul. Eles pediram ressarcimento de perdas e danos provocados por sua inclusão nestes bancos de dados.

Foi um avanço que o STJ tenha aberto espaço para debater um tema de interesse tão abrangente. Expusemos nossa visão, de que deve haver fiscalização das atividades de score, para que sejam utilizados padrões mínimos nesta avaliação. E, principalmente, para que o cidadão tenha acesso ao que conste contra ele, a fim de que possa se defender de eventuais erros, preconceitos, violação de intimidade e do uso de informações imprestáveis ou prescritas.

Lembro que o cadastro positivo, aprovado com estardalhaço, como o elixir que facilitaria o crédito de quem pagasse suas contas em dia, não reduziu, até agora, as taxas de juros de ninguém. Funciona, isto sim, como mais uma forma de controlar o histórico financeiro dos cidadãos.

Vivemos em uma sociedade do ‘Grande’Irmão, em que câmeras acompanham nossos passos. Nossos hábitos de consumo e lazer são mapeados e comercializados. A privacidade e o direito à intimidade são amplamente revogados no dia a dia, pela invasão de nossos espaços.

Permitir que isso ocorra também no crédito pessoal, é reduzir os direitos dos cidadãos. Estamos mobilizados para impedir que tal desrespeito continue a ser praticado impunemente. Quem é negativado, por exemplo, por não pagar prestações de uma conta, já foi penalizado com a restrição do crédito. Esse é o objetivo da negativação, que cessa quando as contas forem quitadas.

Tenho esperança de que o STJ coloque ponto final nesta história. Que normas e fiscalizações delimitem o campo de atuação destas empresas de pontuação. A cidadania é uma construção constante, que exige total atenção e dedicação, para que nossos direitos não sejam jogados no lixo.

Relate às entidades de defesa do consumidor situações em que dificuldades de crédito possam ser atribuídas a uma pontuação desconhecida. Cobre mais informações da loja ou do banco, quando seu crédito for negado. Questione por que os juros de seu financiamento estão mais elevados do que os anunciados pela instituição financeira.

Há muitos ‘pontos’ importantes nesta questão, que vão além das compras que fazemos diariamente.