O projeto que ajusta o Código de Defesa do Consumidor (CDC), cuja votação foi prometida para antes da Copa do Mundo, talvez fique para o esforço concentrado da primeira semana de julho. Tem três focos que interessam sobremaneira ao consumidor: comércio eletrônico, proteção contra o superendividamento familiar e maior autonomia para os Procons.
Por que a demora na votação? Provavelmente, pelos interesses em jogo. Para adiar o processo, foi sugerido até o envio dos textos para avaliação na Comissão de Constituição e Justiça. Estranho, uma vez que já estavam na pauta de votação.
Vejamos cada mudança que deverá ocorrer no CDC. Hoje, as vendas pela Internet são uma loteria. Mesmo lojas virtuais de renome atrasam, ocasional ou frequentemente, a entrega de produtos já pagos. Algumas, nem entregam. Se já é difícil discutir problemas de telefonia, por exemplo, face a face com as operadoras, imaginem fazer isso com estabelecimentos que, muitas vezes, não têm endereço físico. A responsabilidade solidária entre site de vendas e fornecedores pode ajudar, sim, a reduzir os golpes. Afinal, fabricantes têm endereço conhecido e não gostariam de arcar com a responsabilidade por ações indevidas de lojistas da web. Cobrar, também, divulgação mais clara dos dados do fornecedor e da localização da empresa digital iria na mesma direção, de oferecer mais segurança aos compradores. Lucrariam todos os que agissem com honestidade e boa-fé.
Outro aspecto relevante é o fortalecimento dos Procons. Sem a atuação firme deste órgão público, dificilmente o CDC teria ‘pegado’ e se tornado uma das melhores legislações, em todo o mundo, na defesa dos direitos dos consumidores. Com mais autonomia para intermediar acordos entre vendedores e compradores, a instituição ficará mais forte. Os Procons ganharão, além disso, poder para negociar a devolução de valores pagos. Seria outra medida bem-vinda, nesta época em que se discute seriamente a importância da conciliação, pois a Justiça tem excessiva demanda.
Por último, mas não menos importante, alteração do CDC tratará mais detalhadamente do superendividamento, praga que se desenvolve no Brasil até por estímulo governamental. É bom ampliar o crédito para os cidadãos, mas não se pode fazer tal coisa sem considerar que os juros sobem à estratosfera, na tentativa de combater a inflação sem equilibrar os gastos públicos. Não é possível que empresas continuem a oferecer crédito ‘sem juros’ ou com ‘juro zero’, uma falácia porque é elevado o custo do dinheiro no Brasil.
É elogiável que os ajustes propostos para o CDC ampliem os direitos do consumidor. Muitos de nós temiam que a abertura dessa ‘janela’ de mudanças fosse aproveitada para abrandar os melhores aspectos desta legislação. Felizmente, tal ameaça não se concretizou. Foi um trabalho bem feito, que merece ser fechado com chave de ouro. Ou seja, votado e aprovado exatamente como foi redigido. Até porque sabemos como são raras as iniciativas que beneficiem a população.
Houve respostas rápidas às manifestações de 2013, mas quase nada saiu do papel. Os brasileiros têm deixado bem claro que esperam aperfeiçoamentos nas instituições, nas leis e nas práticas do país. E mais: que desejam isto para já, não dentro de algumas décadas. As relações de consumo são importantíssimas em nosso dia a dia. Comprar é mais do adquirir bens e serviços. É melhorar a estrutura do lar, a segurança familiar e o acesso à saúde, educação, transporte, cultura e lazer. Quem não entende isso, deveria se reciclar com urgência. Os avanços virão de qualquer forma. Que venham, então, com mais bom senso e menos confronto.