Quando os legisladores fazem a diferença

Por Maria Inês Dolci

Costumamos nos queixar de que o sistema político brasileiro não corresponde aos anseios da população brasileira. Causam-nos insatisfação e desalento as denúncias de corrupção, de malversação de dinheiro público e a postergação de providências que poderiam melhorar o país.

Nenhum reparo a essas ponderações. Mas temos de reconhecer que, quando nos mobilizamos e trabalhamos com perseverança, tendo meta definidas com abrangência social relevante, há mais chances de sucesso.

Foi o caso emblemático do Código de Defesa do Consumidor (CDC), legislação avançada e democrática, que em sua concepção reuniu juristas, defensores dos direitos dos cidadãos e legisladores. Hoje, é um dos mais completos e bem estruturados do mundo, contribuindo para relações de consumo mais harmônicas ou, no mínimo, menos nocivas aos cidadãos.

A campanha pública contra o tabagismo também é extremamente bem-sucedida no Brasil. Em duas décadas, o consumo de tabaco caiu pela metade. Há desafios a vencer, evidentemente, como intensificar a conscientização das populações de baixa renda, que ainda fumam muito.

Da mesma forma, começou a mudar, nas últimas décadas, a visão de segurança veicular. O primeiro passo foi, provavelmente, a obrigatoriedade do uso do cinto de segurança, que deve ter preservado a integridade e a vida de milhares de pessoas. O trânsito brasileiro ainda provoca 50 mil mortes ao ano. Para que enfatizar o absurdo disso, basta fazer as contas: em 20 anos, quase um milhão de pessoas morreu em acidentes diversos.

Sempre alertamos que os veículos vendidos em nosso país eram menos seguros do que os similares europeus, norte-americanos e japoneses, por exemplo. Comprovamos isso com testes de colisão (crash test). E defendemos publicamente que airbag e freios ABS fossem obrigatórios nos carros destinados ao nosso mercado.

A mobilização deu certo, com implantação gradativa da lei. Em janeiro próximo, contudo, não haverá mais exceções. Todos os veículos terão de ser comercializados com esses dois acessórios fundamentais.

Sem dúvida, tal medida ajudará a reduzir as colisões (devido ao ABS, um sistema que evita o travamento das rodas em uma freada brusca), além de evitar ferimentos e mortes (pois o airbag é uma bolsa de ar que protege condutores e passageiros).

Recentemente, tivemos uma boa notícia: pela primeira vez, um carro fabricado no Brasil (EcoSport, da Ford) recebeu cinco estrelas pela segurança em colisões no Programa de Avaliação de Carros Novos da América Latina – Latin NCap.

Tornar os carros mais seguros não evita todos os acidentes, é óbvio, pois parcela expressiva deles é provocada por desrespeito às leias e à sinalização. E pelas infrações à lei seca.

Mas se os veículos já saírem de fábrica mais seguros, reduziremos, sim, os ferimentos e mortes decorrentes de acidentes de trânsito.

Percebemos, também, que as autoridades estão trabalhando para deter a carnificina sobre rodas.

No último dia 4, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou projeto de lei que aumenta multas para seis infrações gravíssimas de trânsito: dirigir sem habilitação; omitir socorro; disputar racha; fazer manobras perigosas; fazer manobras esportivas; não reduzir velocidade quando houver passeatas, escolas, hospitais e estações de embarque e desembarque de passageiros.

Se aprovado, as multas subirão para até R$ 1.915,00. Poderá ocorrer, também, cassação da carteira (por exemplo, quando o motorista tiver consumido álcool ou outras substâncias psicoativas). A própria autoridade de trânsito poderá determinar, de forma cautelar, a suspensão do direito de dirigir.

Além disso, foi aprovado pelos senadores da CCJ projeto de lei que torna obrigatório que os motociclistas usem coletes infláveis, e a instalação de limitadores de velocidade nas motocicletas. Esses dispositivos não permitirão que seja ultrapassada a velocidade de 110 quilômetros por hora.

Esperamos que se torne lei rapidamente.

O caminho é longo, mas já iniciamos a jornada para melhorar um dos mais graves problemas brasileiros.