Agências de empresas

Por Maria Inês Dolci

Tenho escrito e falado inúmeras vezes, sem medo de me tornar repetitiva, que as agências reguladoras são parciais, pois , na maioria das vezes, defendem os direitos das empresas, em detrimento dos consumidores.

Se havia qualquer dúvida quanto a essa afirmação, ela caiu por terra com dois casos concretos, ocorridos nos últimos dias. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que as passagens aéreas subiram mais de 130% acima da inflação desde 2005, Foi um contraponto à pesquisa da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que, com os dados das companhias aéreas, utilizou outra metodologia e constatou queda na média da tarifa doméstica.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) foi ainda mais longe em sua opção preferencial pelas empresas da área: entrou com ação judicial no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para pedir a suspensão de liminar, anteriormente concedida pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, que proibia o limite de tempo de validade para crédito de celulares pré-pagos.

Como não é comum acontecer, o STJ decidiu em favor das operadoras. Quem ficou ao lado do consumidor, mesmo? Nesse caso, honrosamente, o TRF.

Seria irônico, se não fosse absurdo, o argumento da Anatel de que a suspensão da liminar evitaria aumentos de preços ao consumidor e preservaria o modelo de negócios pré-pago.

Deve ser por solidariedade similar que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) posicionou-se contra o ressarcimento ou compensação dos R$ 7 bilhões pagos a mais nas contas de luz, por erro de metodologia na definição das mensalidades.

Anac, Anatel e Aneel não estão cumprindo suas funções, que são de equilibrar o mercado, e não de defender com unhas e dentes os interesses das empresas que atuam nas áreas reguladas por essas agências.

Fica mais fácil de entender por que os brasileiros pagam tarifas altíssimas e recebem serviços de má qualidade.

Deve-se elogiar a atitude do IBGE, que manteve a tradição de informações estatísticas verdadeiras, sem se vincular ao governante de plantão. Empresas públicas, nunca é demais enfatizar, pertencem aos cidadãos, e não às gestões governamentais, muito menos a partidos políticos.

Nós bancamos as agências reguladoras com nossos impostos, direta e indiretamente. É triste que essa conta seja paga para que a gangorra regulatória sempre penda para o lado mais forte na relação de serviços.

Isso não surpreende, lamentavelmente, porque os argumentos para as malvadezas são muito ‘criativos’, como comparar o Imposto Predial e Territorial Urbano da cidade de São Paulo, elevado às nuvens pela prefeitura, ao condomínio residencial que nos alivia o bolso.

A combinação de desinteresse pelos direitos do consumidor com a avidez arrecadatória brasileira nos deixa no pior dos mundos: aquele em que a nossa carteira não tem sossego um minuto, porque estamos sempre bancando algum aumento de tributos. Exceto quando estamos pagando um novo imposto.

As exceções – como a pesquisa correta do IBGE e a manifestação direta do presidente da Embratur, Flávio Dino, de que as empresas deveriam explorar o turismo, não o turista – não são suficientes para compensar os abusos enfrentados pelos cidadãos em todas as áreas.

As entidades de defesa do consumidor cumprem seu papel, diariamente, mas o trabalho é extremamente dificultado pela incompreensão de parte do Judiciário e pela complacência das agências com os atos empresariais que deveriam regular.

Dessa forma, a corda continuará rebentando do lado mais fraco, por muito tempo ainda.