Manifestações e resultados

Por FABIANA FUTEMA

As manifestações vão chegar à defesa dos direitos do consumidor? Não sei dizer, mas espero que este tema entre na pauta de discussões.

O Brasil precisa melhorar muito. É o que diferencia uma democracia do autoritarismo. Governos eleitos pelo povo têm de fazer mais. Não nos contentamos com pouco, e nem devemos.

Vejamos, por exemplo, a defesa do consumidor. É óbvio que, com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), instituído em 1990, as coisas melhoraram muito. Leis costumam ser mais fortes quando são fruto do amadurecimento de um país. Formalizam como se deve proceder e o que esperar de determinados relacionamentos, como os de consumo, pois demarcam limites.

Assim, vamos em frente. Dessa maneira, evoluímos e melhoramos.

O fato de criar e aprovar leis, contudo, não resolve tudo. Há que brigar por elas, para que se tornem realidade, mais do que cartas de intenções.

Pensemos, por exemplo, nas tarifas de ônibus. Elas impactam a vida dos cidadãos, e são caras. Tão ruins ou até piores do que seus preços são as dificuldades de locomoção. Ônibus que se arrastam, por horas, para percorrer 10 quilômetros ou um pouco mais em grandes cidades.

Temos a impressão de que, caminhando, o tempo despendido seria bem menor. O serviço mais caro é aquele que não funciona. O que não cumpre aquilo que é esperado pelas pessoas.

Quem sai de casa todos os dias, espera chegar ao trabalho em um tempo razoável, com algum conforto e higiene. Isso é pedir demais? Não, é desejar o possível.

Lamentavelmente, os serviços públicos no Brasil não têm qualidade. Dão-nos a impressão de que os impostos são meros instrumentos de arrecadação, sem a contrapartida de prestação de serviços.

Não há como colorir este quadro. Governantes falam como se não tivessem nenhuma responsabilidade por tudo isso. Só falta dizerem que concordam com tudo, mas que não podem fazer nada.

O ato de consumir produtos e serviços também tem a ver com cidadania. Não é simplesmente a aquisição de algo. É muito mais: a realização de um desejo ou de uma necessidade. Por que não mereceríamos um tratamento respeitoso, digno, com o cumprimento do que está escrito no contrato?

Situações como o não recebimento de um móvel já pago ou um celular que não funciona são semelhantes a cruzar um sinal vermelho no semáforo. Há um código de comportamento e normas de trânsito para que um carro não se choque com outro, e para que um pedestre não seja atropelado.

Ora, quem simplesmente ignora a sinalização comete um crime e quebra um acordo de convivência.

Da mesma forma, desrespeitar o consumidor é ignorar o que foi acordado.  Não vale o que foi combinado e firmado. Como viver em uma sociedade assim?

Democracia é um grande acordo, um ajuste de interesses às vezes opostos, frequentemente contraditórios, porque, como diz o ditado, em cada cabeça há uma sentença.

Quem entra em uma loja para comprar um produto, além de consumidor, também é cidadão, contribuinte e eleitor. Tem direitos legais definidos pelo CDC. O fato de atropelarem estas leis não significa que não sejam importantes.

Princípios e instituições democráticas não são óbvios. Temos de aprender a valorizá-los e a conviver com eles.

Com o tempo, adaptaremos nossos comportamentos aos códigos e às determinações mais avançadas. Assim como os manifestantes romperam suas inércias e foram às ruas protestar contra os reajustes das tarifas de ônibus.

Aceitamos muitas coisas, até o dia em que dizemos basta. Isso já ocorreu com a inflação e com a ditadura militar. Não há quem segure um povo que, unido e pacificamente, diga que não concorda com determinada prática, abuso ou desrespeito.

Muralhas não contêm justas reivindicações, se forem expostas com determinação e confiança. Isso vale para o transporte coletivo, bem como para as relações de consumo. Um dia o cenário mudará, e enxergaremos cores que, antes, não pareciam pertencer às palhetas já conhecidas.

Veremos, com o passar do tempo, o quanto mudamos de verdade.